*Por Miguel Passos
Já faz algum tempo que virou praxe afirmar que a carga tributária brasileira é uma das grandes (se não a maior) vilãs do ecossistema empreendedor local. De fato, o Brasil está muito longe de ser um paraíso fiscal. Mas, calma! Podemos estar abordando o assunto sob uma visão indevidamente simplista. Ou seja, em se tratando de sistema tributário no Brasil, com o perdão do termo chulo, o buraco é mais embaixo.
Em que pese o fato de alguns produtos classificados como não essenciais, a exemplo de bebidas alcoólicas, perfumes, cigarros e jogos eletrônicos, terem até 80% de seu preço final constituído por impostos, em se tratando de um panorama geral no tocante à carga tributária, temos sempre que analisar os dados de modo comparativo.
Estudo realizado pelo Instituto Fiscal Independente do Senado Federal (IFI)1, em parceria com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), indica que a carga tributária brasileira se estabilizou na casa dos 32% do PIB no período que vai de 2009 a 2016, passando a se situar cerca de 2p.p. do PIB abaixo da média dos países da OCDE.
Outro estudo mostra que, levando-se em consideração um ordenamento decrescente da carga tributária entre o Brasil e os países da OCDE, o país teria caído da 15a posição em 2009 para a 23a posição no ano de 2016. Ou seja, dentre os 35 países membros da OCDE, 22 têm uma relação carga tributária x PIB superior ao Brasil.
Já de acordo com os dados divulgados pela Fenacon2, temos nada menos que 63 tributos, 97 obrigações acessórias e 3.790 normas somente para a rubrica de impostos, que é uma das espécies de tributo. Como consequência, no Brasil as empresas gastam quase duas mil horas e R$ 60 bilhões apenas em burocracia tributária, todos os anos3.
Sendo assim, o maior problema do Brasil não é a elevada carga tributária, mas o custo para cumprir com todo o cipoal de regras dispostas na legislação. O chamado “compliance”.
Não é à toa que, em se tratando de facilidade para fazer negócios e competitividade, o Brasil está sempre mal posicionado em qualquer ranking que se realize entre países. Sem falar do arrepio que os empreendedores locais sentem diante do termo “impostos”.
Outro exemplo é o SIMPLES Nacional. Criado para simplificar o compliance tributário e reduzir a carga incidente sobre as operações realizadas por empresas com faturamento anual de até R$ 4,8 milhões, hoje possui tantas regras de cálculo que, de “simples”, só restou mesmo o nome.
Diante deste cenário, encher o departamento fiscal das empresas e escritórios de contabilidade com profissionais “baratos” não resolve a questão. E me espanta ver que muitos empresários e gestores continuam a fazer isso e a colocar a culpa exclusivamente na carga tributária. Me desculpem a franqueza, mas essa visão é completamente míope.
Existe um custo implícito, que passa longe das guias de recolhimento dos tributos e para o qual poucos se atentam. Investir na estruturação dos processos internos, aplicar intensivamente tecnologia e qualificar a mão de obra é o antídoto contra esse mal.
Tal postura, além de fazer bem para o caixa da empresa, via otimização dos custos, resguarda a sua competitividade enquanto a tão esperada reforma tributária não chega.
*Miguel Passos é Contador, especialista em Finanças e Controladoria e Sócio Fundador da FAPS BPO Integrado.